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terça-feira, 19 de novembro de 2019

O voo de brilhantes pássaros artistas



Édier William[1]

Palavras, por meio delas acreditam alguns que o universo foi construído e é por meio delas que o mundo gira. Palavra no livro, palavra no copo, no rádio, no céu. Palavra escrita, palavra falada, cantada. São as palavras que contam a vida e inventam histórias.
Saber usar as palavras para criar histórias, no entanto, pode ser considerado um dom que poucos têm. Uma história mal contada é como comer um banquete sem tempero, ouvir uma música sem poesia... Agora imagine saber contar uma história sem usar um único fonema. É exatamente assim que “Onde morrem os pássaros” é encenada, sem palavras. Assisti esse espetáculo em sua estreia no Teatro 1 do Sesc Esplanada.

Saber contar uma história por meio de imagens e movimentos no teatro, talvez seja uma das coisas mais difíceis. Poucas vezes assisti algum espetáculo com essa proposta que tenha conseguido metade do que Fabiano Barros, dramaturgo e diretor do espetáculo, conseguiu.
O espetáculo reflete sobre um dos maiores males desse século, a depressão. Um homem, interpretado pelo ator Artur Neto, mergulhado em solidão vive em uma rotina monótona e surrealista, que aos poucos vai submergindo o espectador em uma profunda melancolia poética. Em dado momento uma mulher, Laura Martins, surge para trazer um pouco de vida para o homem, mas é rejeitada por diversas vezes, ela tenta ajudá-lo a sair do fundo do posso do looping em que entrara, sem sucesso.
Trazendo para nossa realidade é como estar presenciando no palco uma pessoa que acorda e não tem forças para se levantar da cama, está aprisionada ao celular, à TV, ao quarto. Uma pessoa que sai do quarto para fazer o xixi que não tem, pois não bebeu água, para comer o que não tem na geladeira, pois não saiu para comprar nada, que volta ao quarto e coloca uma música que não ouve, pois está perdido na timeline de alguém que não conhece, desejando ter algo que nunca terá sem se levantar para trabalhar.
Há genialidade na forma que Fabiano Barros conta a história juntamente com os não menos geniais atuadores. É necessário ressaltar que a dramaturgia sonora que ficou a cargo de Rinaldo Santos é espetacular, consegue causar inúmeras sensações na alma e na carne dos espectadores. A única ressalva sobre a música é a sua execução ao vivo, à mostra, ao lado do cenário, isso desvia um pouco da concentração de alguns espectadores.
Foto divulgação.
A iluminação e cenografia são clássicas, uma escolha do diretor que funciona, mas poderia trazer mais impacto se fossem contemporâneas, já que o espetáculo aborda questões extremamente atuais.
Um espetáculo, durante sua jornada de apresentações, passa por um processo de amadurecimento, esse espetáculo, que já nasceu maduro, poderá se tornar ainda mais impactante, conforme o ritmo for melhor definido e o espetáculo, que teve mais de uma hora e vinte minutos, se torne preciso quanto ao que precisa ser dito por meio dos movimentos em cena.
Onde morrem os pássaros? Assista e descubra, ou quem sabe fique com ainda mais dúvidas, mas tenha certeza de que assistirá uma obra de arte incrível!


[1] Édier William Medeiros da Silva, graduado em Letras, FIAR (2012), Especialização em Metodologia do Ensino Superior, FAEL (2016), Técnico em Produção Audiovisual, CEP (2015). É escritor, dramaturgo, ator, diretor e produtor cultural.

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