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quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

Do Silêncio ao Quebracabeça

 

Adailtom Alves Teixeira

A fluminense Ângela Cavalcante e o argentino Alejandro Bedotti chegaram em Rondônia em 1979, passando antes em Rio Branco/AC para ministrarem oficinas de teatro. A dupla aportam com o Grupo del Silencio. Bedotti veio para trabalhar no Sesc, entretanto rompe rapidamente com a instituição e saem novamente em viagem. Criam o Grupo Cipó, conforme me relatou Ângela, já não eram apenas os dois, havia atores locais, então melhor seria um outro nome.

A vivência Amazônia toco-os profundamente, realizaram laboratório “do outro lado do rio”, como afirmou Cavalcante em entrevista. O objetivo era levar à cena os sons e aquela sensação para o espetáculo  Rio eu rio é... gente!, que teve estreia no auditório da Escola Estadual Camela Dutra – a época era um único espaço com algo que se aproximava a uma casa de espetáculo – em 1981.

Logo após a estreia, o grupo teve oportunidade de se apresentar em outros estados, pois participou do projeto nacional, o Mambembão, realizado pelo Serviço Nacional de Teatro, vinculado ao Ministério da Educação e Cultura (MEC). Na matéria do jornal Alto Madeira (Cf. imagem), somos informados que o grupo estava em São Paulo, no teatro Maria Della Costa.

Jornal Alto Madeira, 21 de janeiro de 1981, p. 3

continuidade da matéria
Jornal Alto Madeira, 21 de janeiro de 1981, p. 3

No ano seguinte, 1982, Cavalcante e Bedotti abandonam novamente o nome Cipó e criam outro coletivo, o Quebracabeça, que apesar de estarem longe da cena a um certo tempo, existe até hoje. Muitas foram as pessoas que circularam e se formaram nos coletivos criados por Ângela e Alejandro, artistas de proa do movimento teatral do estado de Rondônia, sobretudo na década de 1980, quando participaram ativamente com outros atores e atrizes da criação da Federação de Teatro Amador, mas isso é história para abordarmos em outro texto.


quarta-feira, 18 de janeiro de 2023

O teatro da década de 1980 em Porto Velho: contexto

 

Adailtom Alves Teixeira[1]

             A criação deste blog se insere em um processo de pesquisa iniciado em 2017, quando desenvolvi um projeto de extensão pelo Departamento de Artes da Universidade Federal de Rondônia (Unir), junto ao Curso de Licenciatura em Teatro, chamado de Conversa de Quinta: arte e cultura em debate. Naquele momento foram realizados alguns encontros com diversos fazedores e registrados em vídeo, disponibilizados em meu canal no YouTube. O objetivo era conhecer um pouco mais da história do teatro local, já que eu havia aportado na cidade em 2014. Tal projeto desembocou em um projeto de pesquisa maior, um doutoramento, ainda em curso, no qual eu pesquiso quatro décadas da prática dessa linguagem na capital rondoniense (1978-2018). Por estar no último ano do doutoramento e posto que a década de 1980 está um pouco mais distanciada, vou registrar e divulgar por aqui alguns documentos encontrados ou disponibilizados pelos fazedores daquele período, de forma que outros/as pesquisadores/as e interessados/as em geral possam acessá-los.

            A década em tela é significativa por diversos motivos, afinal foi em dezembro de 1981 que Rondônia deixou de ser Território e passou a ser Unidade Federativa, fazendo com que a bandeira brasileira ganhasse mais uma estrela. Além disso, foi uma década de muitas mudanças e esperanças, viveu-se o fim de uma ditadura que durou vinte e um anos; houve todo um movimento político forte e a criação de um pacto nacional, elegendo deputados/as constituintes e daí nascendo uma nova Constituição (1988), vigente até hoje; em Rondônia houve esperança de uma nova vida para muitas pessoas, pois naquele momento teve um intenso crescimento populacional, devido as grandes levas de migrantes que o estado recebeu, processo que impactou também a linguagem teatral, sendo que, até hoje, muitos dos fazedores mais experientes e ainda atuantes são pessoas vindas de outros lugares do Brasil e aqui auxiliaram na diversidade cultural da cidade de Porto Velho por meio do teatro.

             

Matéria do jornal Alto Madeira, publicado em 22 e 23 de fevereiro de 1981 à página 3.

O primeiro documento que ora apresento, ainda não é sobre teatro, mas justamente uma matéria do jornal Alto Madeira que aborda essas grandes mudanças que ocorria em Rondônia: a mudança de Território para estado; o crescimento populacional devido à migração, posto que o censo revelou uma verdadeira “explosão” em uma década, já que em 1970 eram pouco mais de 150 mil habitantes que ocupavam sobretudo Porto Velho e Guajará-Mirim e em 1980, devido aos mais de 500 mil migrantes – que continuariam a chegar por toda década, chegou próximo de um milhão de habitantes; a matéria apresenta Rondônia como um estado agrícola, em certa medida graças aos projetos de colonização que havia na época, tanto que foram assentadas 12 mil famílias no ano anterior (1980) e se previa o assentamento de mais 15 mil em 1981. Evidente que todos esses processos são contraditórios e merecem serem conhecidos e esmiuçados, não é meu intuito aprofundar aqui, mas fica o alerta cabendo apenas informar que há pesquisas sobre tais temas.



[1] Doutorando em Artes pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista (Unesp); mestre em Artes pela mesma instituição; graduado em História pela Universidade Cruzeiro do Sul; professor adjunto do Departamento de Artes da Unir; autor do livro Teatro de Rua – identidade, território pela Giostri (2020) e coorganizador do livro Paky'op: experiências, travessias, práxis cênica e docência em Teatro pela Edufro (2022); articulador da Rede Brasileira de Teatro de Rua (RBTR); ator e diretor teatral; integrante do Teatro Ruante.

terça-feira, 3 de janeiro de 2023

A cultura rondoniense merece uma secretaria

 

Adailtom Alves Teixeira[1]

             O governador Marcos Rocha (União Brasil), reeleito para mais quatro anos nomeou para a Superintendência da Juventude, Cultura, Esporte e Lazer (Sejucel) o ex-jogador Júnior Lopes (Lourival Júnior de Araújo Lopes), que agradeceu o mandatário: “Obrigado @celmarcosrocha, o senhor tem toda minha admiração e respeito, tem sido um líder incrível para mim, cuidando e me orientando nos mínimos detalhes, me tratando como um Filho, não tenho palavras para lhe agradecer por essa oportunidade, pois para mim não se trata de um cargo, mais se trata de uma posição que terei a oportunidade de potencializar tudo que meu pai e eu Fizemos a vida inteira sem pedir nada em troca, que foi Transformar vidas através do Esporte, proporcionando lazer, trazendo cultura e ajudando os jovens do nosso Estado” (disponível aqui). Até onde apuramos, a carreira do atleta o qualifica para assumir a gestão do esporte, posto ter larga experiência na área. No entanto, há que se perguntar: e a cultura?

            Perdida em uma pasta sem status de secretaria e somada a diversas outras áreas, a cultura em Rondônia vem sofrendo seus percalços, pois as pessoas alocadas nas últimas gestões para gerirem a Sejucel vem de áreas poucas afeitas à cultura. A gestão dos recursos advindas da Lei Aldir Blanc – em Rondônia foram mais de 18 milhões de reais –, revelou a imensa potência criativa e artística no estado e a evidente necessidade de uma pasta própria, com pessoas que entendam dos fundamentos da cultura, de suas políticas e gestão. E desde já, cabe ressaltar que o poder público não tem que fazer cultura, mas criar as condições para quem de fato faz, seu papel é criar, em diálogo com o movimento cultural, políticas públicas adequadas, de forma a permitir a expressão artística em sua potência, garantindo o acesso das artes às/aos cidadãs/ãos em geral.

            A Rede ProCultura, movimento articulado em todo o estado, vem discutindo e pleiteando que a cultura seja desmembrada da Sejucel e que seja criada uma secretaria específica. Na última eleição esta foi uma de suas reivindicações, por meio de documento (aqui) entregue para alguns candidatos. No entanto, durante a campanha o movimento não foi recebido pelo governador Marcos Rocha, mas cabe informar que este, em entrevista no programa Conexão do Rondônia ao Vivo (aqui), manifestou seu desejo de desmembrar a Superintendência, mas tratando apenas do esporte, isto é, prometeu separar o esporte das demais áreas.

            Faz-se necessário uma secretaria específica de cultura, posto haver inclusive uma política pública no estado, o Fundo de Desenvolvimento Cultural, ainda que venha funcionando de forma intermitente, mas mais que isso, devido aos rumos nacionais que se apresentam para a cultura brasileira, como a volta do Ministério da Cultura e leis e recursos já assegurados para a área pelos próximos anos, via Lei Paulo Gustavo e Lei Aldir Blanc 2. Rondônia é um polo produtor de cultura importantíssimo, com festivais de teatro e grupos reconhecidos nacionalmente, uma música potente, um audiovisual que vem se destacando ao ganhar prêmios Brasil a fora e uma cultura popular vastíssima, além de uma cultura indígena, quilombola e ribeirinha que merece aparecer para todo o país. É certo que toda essa potência gerará muitos empregos e divisas em todo estado, além de fortalecer a identidade e outros aspectos simbólicos de Rondônia. É certo também que o movimento cultural rondoniense deseja ver cumprida a promessa do governador Marcos Rocha, o desmembramento da Sejucel e a criação de uma secretaria de cultura, para que os artistas dos diversos segmentos, bem como os gestores de cultura dos municípios possam ter um diálogo mais aprofundado sobre a área cultural.



[1] Doutorando em Artes pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista (Unesp); mestre em Artes pela mesma instituição; graduado em História; professor adjunto do Departamento de Artes da Universidade Federal de Rondônia (Unir); articulador da Rede Brasileira de Teatro de Rua (RBTR); ator e diretor integrante do Teatro Ruante.