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terça-feira, 23 de julho de 2019

MEMÓRIAS DA MARGEM: O NÃO-RIO, AS LAVADEIRAS E A HISTÓRIA QUE RENASCE


Dennis Weberton Vendruscolo Gonçalves[1]

Trabalho apresentado ao curso de Licenciatura em Teatro da Fundação Universidade Federal de Rondônia (UNIR), na disciplina “Teatro Brasileiro”, sob orientação do Professor Mestre Adailtom Alves Teixeira.

Acompanhe o processo de montagem do espetáculo “À Margem”, idealizado por mulheres do Grupo de Teatro Wankabuki, de Vilhena (RO)

“Caiu, caiu, do pé de ipê, uma flor amarela bonita de ver”, cantam enquanto descem a barranca de um rio. Você vai ouvir mais uma vez, quem sabe a única vez o canto delas.  Essas mulheres que viram e ouviram a história contada nas feiras, após missas, num encontro furtivo entre comadres, nas beiras dos rios, seus locais de trabalho. Nessa história gente importante é vista de longe, com olhos bem miúdos e com pouca palavra. Outras bocas, as bocas e braços invisíveis, desenrolam as trouxas de lembranças, de fragmentos domésticos, esfregam as roupas-memórias, enxáguam na água-acontecimento-esquecimento e colocam para secar nos varais do tempo. Um tempo em que poeira, lama, suor, e por que não, lágrimas, garantiam o sustento de muitas mulheres e suas famílias em Rondônia. Este estado, com todas as suas complexidades e disparidades, com céu azul, como brada o hino rondoniense, e também com seus rios assoreados, mortos, encurralados, é revisitado no espetáculo “À Margem”, realizado por mulheres artistas do Grupo de Teatro Wankabuki, localizado no município de Vilhena, distante mais de 700 km da capital Porto Velho.
Valdete Sousa. Foto Dennis Weber.
A trama de “À Margem” foi construída a partir de vozes femininas, de mães e avós, que em cena contam as histórias de rios mortos e também de famílias que abandonaram suas origens em outras paragens do Brasil e partiram em busca do Eldorado, da terra prometida, da fartura disponível mais ao Norte, como bradavam os anúncios midiáticos. “Em 2016 nós montamos ‘Contos do não-rio’ [uma breve cena apresentada na segunda edição do Festival Amazônico de Monólogos e Breves Cenas] que provém de uma pesquisa sobre a vinda das nossas mães para cá. Eu sentia necessidade de começar a falar daquilo que é nosso. Eu queria contar a história de um rio morto, como tantos outros que temos aqui na cidade, dentre eles o Pires de Sá. Ao mesmo tempo eu via que a história desse rio passava pela história da ocupação de Vilhena. Enquanto a cidade ia crescendo o rio ia minguando, então queria falar sobre isso. Comecei a conversar com minha mãe e com pessoas mais velhas, perguntando como que era quando elas tinham chegado aqui. Daí eu tive esse estalo da vinda da minha própria mãe e comecei a relembrar as histórias que escutei na infância e desta forma foi surgindo a dramaturgia de ‘À Margem’”, relata Valdete Sousa, uma das fundadoras do Grupo de Teatro Wankabuki e responsável pela dramaturgia e direção de “À Margem”, espetáculo contemplado pelo Prêmio Sesc de Incentivo às Artes Cênicas em 2018.


Resgatando um quase morto
O Rio Pires de Sá, ao qual Valdete se refere, é um dos mais importantes de Vilhena e está localizado, em partes, na zona urbana do município. Ao longo do processo de ocupação populacional, o rio foi degradado, chegando a quase sumir. Quase. Através da iniciativa da professora Ana Neri, que atua em uma escola estadual, um projeto propôs a recuperação de nascentes e matas ciliares. O resultado foi o plantio de mais de sete mil mudas e a preservação de uma das nascentes, como aponta uma reportagem publicada em 24 de outubro de 2014 pelo Portal de Notícias G1 Rondônia. Em contato com a professora, Valdete tomou conhecimento das pesquisas realizadas.  “Ela tem essa pesquisa com mais de dez anos, que faz junto com os alunos da escola. Em conversa, ela falava sobre o Pires de Sá, sobre a revitalização do rio, que antes estava só um filete, já não tinha nem água mais, e aí comecei a me interessar muito por essa pesquisa dela e falei ‘Ana Neri a gente tinha que escrever um espetáculo sobre isso né’. Comecei com essas conversas com a minha mãe sobre um rio que tinha quando nos mudamos para Ji-Paraná e que hoje não existe, e era um rio limpinho que pegávamos água. Queria então falar como foi a vinda dessas pessoas para o estado de Rondônia e como isso, de certa forma, foi matando esses rios. No início era disso que eu queria falar e acabou entrando nesta história das lavadeiras, que ficavam nesses rios e que lavavam roupas”, detalha a dramaturga que é licenciada em Letras/Português pela Universidade Federal de Rondônia. 
Tainá Sousa e Valdete Sousa. Foto Dennis Weber.
A partir de relatos orais a Valdete foi tecendo os primeiros contornos da trama já apresentada mais de dez vezes em diferentes cidades do Estado de Rondônia, dentre elas a capital Porto Velho, além de Ariquemes, Nova Mamoré e Vilhena, município onde reside boa parte do Grupo de Teatro Wankabuki. “Fui ouvindo histórias, conversei mais com a Ana Neri, relembrei muitas histórias do meu pai, fui coletando esses fragmentos orais, depois parti para a pesquisa histórica. Li sobre a passagem de Rondon por aqui, a respeito da lenda do Urucumacuã, que conta a história de que aqui nós temos o maior tesouro perdido, que é uma coisa que os incas já pensavam. Fui muito nesse filete da história, que fala sobre a passagem de Rondon pelo Cone Sul, de como ele achou que aqui tinha um tesouro perdido e que iria deixar o país inteiro rico. Depois de tudo isso coletado, eu abandonei o texto por um tempo. Quando ganhamos o prêmio do Sesc retomei as pesquisas.  E aí, durante uma noite inteira acordada, escrevi a peça. Peguei o texto “Contos do não-rio”, reestruturei e redigi como peça mesmo, com os cinqüenta minutos de cena que o espetáculo tem hoje”, narra Valdete.

           Lavadeiras não há mais!
O rio quase morto ganha voz através das bocas de duas lavadeiras, que na peça não possuem nomes, e que podem ser a mãe, a avó ou a tia de você que está lendo esta reportagem. São elas, que ao longo de quase uma hora de espetáculo, vão destrinchar a história de ocupação do estado de Rondônia, da busca desenfreada por riquezas, de pequenos e grandes, e também das desventuras dos mais fracos, daqueles que o discurso hegemônico relegou as margens do processo histórico. “Nós estamos falando de mulheres que não só vieram para Rondônia, mas que ficaram no estado. Na maioria das famílias com as quais conversamos, a família vinha inteira para cá, mas quando chegaram aqui e os homens descobriram o quão duro era trabalhar nessa terra, uma terra com muitas facilidades, mas também dificuldades, então alguns desses homens ficaram com certo melindre, e voltaram para casa, que foi o caso do meu pai, e as mulheres não quiseram voltar, porque a viagem era muito cansativa, e já que estavam aqui, porque não fazer daqui seu lar? Então as mulheres ficaram e criaram seus filhos”, expõe Valdete. 
Foto Dennis Weber.

            A opção por colocar lavadeiras como protagonistas de “À Margem” foi, ao mesmo tempo, um resgate de uma personagem que a tecnologia está suprimindo do imaginário popular, como também uma homenagem à sua mãe que foi lavadeira, explica Valdete. “É uma personagem que está no imaginário da nossa história, mas ele deixou de existir. Você não encontra mais mulheres lavando roupa nos rios. Você vai ao Rio Machado não tem mais ninguém, no Madeira só se for nas comunidades menores que você vai ver alguma mulher lavando. É uma personagem que está começando a desaparecer da nossa região. Apesar de ter muitos rios aqui, você quase não vê mais a mulher na beira do rio com um batente batendo roupa. Era uma personagem que eu queria resgatar, trazer de volta e mostrar ela na cena”, acrescenta. 

           Retrato de todos nós
Partindo de histórias pessoais, de memórias das décadas de 1960, 1970, 1980, “À Margem” tem como ponto de partida narrativo a família de Valdete, desembocando em uma saga que congrega as vivências e desafios de muitas outras e outros que se aventuraram em busca de pedras preciosas, terras e de uma vida menos sofrida. Contar essa saga, para Valdete, não foi difícil. É uma história tão recorrente que poderia ser de qualquer família daqui da região. É muito normal isso acontecer aqui, por isso não foi difícil levar para a cena, porque é uma intimidade que não é só minha, é de um monte de gente. Foi divertido, tem umas passagens que são muito interessantes de lembrar. Eu recordei junto com a minha mãe, ficamos mais próximas. Fiquei muito feliz quando ela viu a peça. Toda vez que vê ela chora, então quer dizer que de alguma maneira a peça está tocando. Venho tentando transformar assuntos pessoais em histórias universais, ideia que eu ouvi do Fabiano Barros. Ele faz muito isso, cada espetáculo dele é uma história que ouviu de alguém e ele vai lá e escreve e transforma em uma coisa em que todo mundo já viveu. Pensei muito sobre isso, em quantas histórias que eu conheço da minha família, ou de algum conhecido e que podem ser trabalhadas em cena. Em “A Margem”  consegui ir permeando pelas histórias da família, junto com a pesquisa sobre Rondônia”,  relata.
Débora Veiga Ruiz. Foto Dennis Weber.
Emoção é o termo utilizado pela atriz Tainá Sousa para definir o que o espetáculo “À Margem” causa nela a cada vez que pisa no palco e interpreta uma das lavadeiras. Em cena ela se depara com episódios familiares de sua mãe e também de seu tio, sua tia e sua avó.  “É sempre emocionante quando falamos a respeito, principalmente para a minha avó, sempre que ela assiste. Nossa família possui uma grande quantidade de histórias, e isso é muito bacana, principalmente pela criatividade de cada uma delas. O espetáculo fluiu facilmente tendo essas memórias como embasamento”, descreve a jovem que é sobrinha de Valdete e está no grupo desde 2014.
Um exemplo de como a dramaturgia de “À Margem” se conecta com as histórias de outras pessoas, que não às da família de Valdete e Tainá, pode ser conferido no relato de Débora Veiga Ruiz, responsável pela sonoplastia do espetáculo. “Apesar de não estar no grupo na época da pesquisa, a história da minha família também é representada ali: família grande de retirantes do nordeste, que vem em busca do ‘Eldorado’ e de uma vida melhor. Minha avó, minha mãe e minhas tias lavaram roupas no Pires de Sá, o nosso ‘não rio’ de hoje”, fala.

         Criando tempos e espaços amazônicos
Sons de passos pisando em folhas secas, passarinhos cantando, outros animaizinhos também registram sonoramente passagem pela cena. Ao mesmo tempo, as lavadeiras cantam amores e desilusões, enquanto lavam as roupas das gentes que vieram do Sul do país.  Com esses elementos sonoros e outros, o espetáculo “À Margem” propõe aos espectadores um mergulho em um tempo e clima amazônicos, como descreve Valdete. “O incômodo que às vezes as pessoas sentem quando assistem ao espetáculo, por ter uma brecha de tempo que não acontece ‘nada’ no palco e fica só a sonoplastia ou com pouca luz, é proposital, porque a gente quer criar esse espaço amazônico. Minha proposta, no início, era que ele fosse totalmente sensorial, que as pessoas sentissem um cheiro de mato, de lugar molhado, de beira de rio, ouvisse o que tem nessa mata que a gente nunca pára pra ouvir, e que sentisse esse tempo amazônico que não passa nunca, que é um tempo looongo. Era nisso que a gente estava pensando quando criamos essa sonoplastia”, relembra.
Grande parte dos efeitos sonoros do espetáculo é executada pela sonoplasta Débora. “A ideia de fazer a sonoplastia ao vivo, era a de levar o público a uma maior imersão à floresta e ao rio, onde se passam as cenas. Na época, a Tainá Sousa fazia a sonoplastia, utilizando apitos, chocalhos e instrumentos que o grupo já possuía. Quando entrei para fazer a sonoplastia fui acrescentando outros sons de pássaros com os apitos que o grupo já tinha, acrescentei o som do ‘caminhar na mata’ e durante a produção também fomos comprando outros instrumentos, como o pau de chuva e o sapo. Então essa sonoplastia está em construção contínua, conforme vamos encontrando elementos que se adéquam ao espetáculo, vou acrescentando. E a própria sonoplastia de cada apresentação, por ser ao vivo, é sempre única. Vou fazendo conforme sinto a cena”, informa a profissional que atualmente estuda o Curso de Tecnologia em Teatro, com ênfase em Sonoplastia em Cuiabá (MT).
Foto Dennis Weber.

Além dos sons da natureza, o espetáculo é marcado por cantos de trabalho. “A maioria são músicas populares e já estão em domínio público, outras eu criei. Nesse espetáculo a música não é ilustrativa, é necessária. Minha mãe, por exemplo, canta várias coisas que ela cantava quando estava lavando roupa ou fazendo algum trabalho manual. Isso é uma coisa que é normal, principalmente para o povo nordestino, que sempre está cantando enquanto trabalha, para entreter a mente, para o tempo passar mais rápido”, explica Valdete.
Enquanto isso, a iluminação do espetáculo, ora amarelada, ora vermelha, recria os dias ensolarados tão comuns em Rondônia.  “A escolha das cores é por conta dessa cor que temos no nosso estado, desse sol. Eu queria trazer essa ideia e um pouco do amarelo representa a cor da água do rio, que é da cor de folha amarelada, que nós temos aqui, que não chega a ser um rio escuro, nem límpido também, é amarelado, e a iluminação ela parte por aí, uma vez que a maioria das cenas vai acontecer embaixo desse sol, com as lavadeiras fazendo o trabalho delas”, esclarece Valdete, que destaca também que “À Margem” pode ser apresentada em espaço aberto. “Depois da estreia, em outras ocasiões apresentamos durante o dia, numa escola, embaixo de umas árvores. Foi lindo, com a iluminação do sol e com as árvores balançando”.

          Um cacaio (ou sarapilha) cheio de recordações
“Nossa, ficou lindo! Que maravilhoso! O senhor é um artista!!!”, elogia Valdete que observa o caminhãzinho feito de madeira pelo artesão Vilson. Estamos em uma manhã de sábado (11 de agosto de 2018), em que a artista verifica o andamento da confecção de alguns objetos de cena do espetáculo, que estreará no Palco Giratório, no dia 16 de setembro de 2018. O ancião apresenta alguns truques que adicionou para o brinquedo/objeto de cena ter melhor desempenho. “Que legal! Isso daqui vai ser um show. Tem é que tomar cuidado, porque a criançada vem tudo em cima”, diz a atriz aos risos. Além do caminhãozinho, que será utilizado na cena de abertura para retratar a vinda dos migrantes ao estado de Rondônia, seu Vilson também está responsável por confeccionar uma mala (onde será guardado o caminhão) e um baú que servirá para armazenar parte do cenário e de apoio para a manipulação dos bonecos. Entre uma conferência e outra, o artesão, sabendo do enredo da peça, confidencia memórias sobre a sua vinda para Rondônia, dentre elas, as características do cacaio, por ele chamado de sarapilha, utilizado por moradores durante suas jornadas entre uma cidade e outra, muitas vezes, percorridas a pé. É nesse espírito de resgate, onde todos os habitantes têm algo a dizer sobre a colonização do estado, que “À Margem” finca sua dramaturgia, provocando identificação até mesmo antes de estrear. 
Foto Dennis Weber.

Antes de ser madeira serrada e esculpida, o caminhão e outros objetos de cena foram ideias que pularam da cabeça de Tainá para os papéis. “As coisas do cenário, a maioria foi a Tainá quem desenhou, os caixotes, o caminhão, a mala. Os outros objetos de cena eu fui inserindo conforme as necessidades, as bacias, os baldes, as panelas, colheres, muito dessas coisas que estão na cena são da minha mãe. A  maioria são de objetos que já tem uma história, uma afetividade que já vem de outros lugares”, informa Valdete.
Tainá, que cursa Arquitetura e Urbanismo, conta que a sua formação contribuiu com alguns conhecimentos extras na hora de pensar os objetos de cena,“[...] mas minha maior experiência com artes manuais adquiri sozinha por ser uma área que me dedico desde a infância. A minha área de formação é importante quanto ao planejamento técnico dos adereços e cenários, assim posso passar para o papel de forma mais precisa e adequada e em seguida executar”.

            Lençóis, bonecos e uma trouxa de roupas com muita prosa  
Os lençóis no varal anunciam que a cena é um local de trabalho. A eles vão se juntar mais tarde, outras estampas, tamanhos, formas e texturas. A água do pequeno riacho instalado em cena, aliada à técnica, ao sabão e à força dos resistentes braços das lavadeiras, vai limpar suor e outros fluídos depositados nas roupas dos migrantes mais abastados. Vai limpar também as roupas das lavadeiras que, com esmero, mantém suas vestimentas sempre em bom estado de conservação. “Para o figurino eu fiz uma pesquisa sobre lavadeiras, vi algumas fotos de mulheres que lavavam roupa no nosso Estado. Também pesquisei sobre lavadeiras em outras partes do país. A partir disso comecei a esboçar o figurino. Fiz uma pesquisa sobre tecidos que eram utilizados na época, conversei com a minha mãe sobre as roupas que ela tinha quando chegou aqui. Demorei certo tempo nesta pesquisa, porque não é fácil achar tecidos mais antigos, os tecidos são todos novos, com elastano e outras coisas e eu queria um tecido que realmente fosse do período. Algumas pessoas falaram na estréia que o figurino tinha que estar amassado, sujo, mas na pesquisa que fiz, não vi nenhuma lavadeira suja, nem amassada, nem mal arrumada.  Elas usavam sim a roupinha para dentro da saia, a blusinha bem abotoada, a roupa limpa, porque afinal de contas elas são lavadeiras, então a roupa tem que estar limpa, porque se elas pegam a roupa dos outros para lavar e chegam lá todas sujas, quem é que vai querem contratar né”, comenta Valdete a respeito de uma das críticas que recebeu sobre o espetáculo.
Tecido é o que não falta em “À Margem”, além de estar presente nos figurinos, espalhado pelo cenário, ele também é a base para confecção de dois bonecos que personificam a infância de Valdete e de seus irmãos. “Com esses bonecos de pano eu queria trazer essa referência da minha infância e da minha irmã. Então eu coloco as duas crianças do espetáculo sendo esses bonecos de pano, para trazer essa lembrança da brincadeira”, explica a atriz que confessa gostar de manipulação de formas animadas: “Desde o início quando comecei a fazer teatro, já trabalhava com a manipulação de fantoches. É um assunto que me interesso muito”.

            História para todas e todos
As vozes que falam em “À Margem” são de gente silenciada pelo discurso hegemônico, varridas ou só lembradas de forma superficial no processo histórico-político do Brasil. “Se for dar voz para aquele que já tem nos livros de história, na TV, ou que já tem o poder, então não tem porque estarmos fazendo esse trabalho. Nós, enquanto atores, dramaturgos, diretores de teatro, precisamos trazer para a cena aquilo que as pessoas não conhecem bem no dia-a-dia. É trazer as nossas lendas que estão desaparecendo, sumindo embaixo de tanta tecnologia. É resgatar nossos personagens cotidianos  os quais passamos por eles todos os dias e fingimos não ver, é apresentar esses personagens que passaram em branco na história e que realmente construíram o Estado, quem com a força de trabalho, com o suor da testa, como diz no texto, construiu esse estado aqui do zero”, argumenta Valdete.
Nubia Labov. Foto Dennis Weber.
As vozes dos esquecidos pela historiografia oficial é o que alicerça “À Margem”, mas só isso não é o suficiente. É preciso contar uma história que o máximo de pessoas compreendam. Para isso, as atrizes do Wankabuki, durante a concepção do espetáculo, pensaram na questão da acessibilidade, propondo a tradução e interpretação em Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). “A interpretação em Libras é algo que descobrimos ao começar a montar o espetáculo “Já passa das oito”. Levamos uma leitura dramatizada da peça para uma escola e lá tinha vinte surdos, aí a Lu Rodrigues [integrante do Grupo de Teatro Wankabuki] conseguiu um tradutor de Libras da escola, e nos apresentamos. Foi tão lindo, a gente se emocionou tanto. Foi tão bom e gratificante, que fiquei com isso na cabeça. E quando fomos montar o projeto para o SESC, o edital pedia a questão da acessibilidade e eu coloquei. O trabalho com a intérprete em cena fazendo a tradução foi maravilhoso, ainda mais com a nossa intérprete, que é a Nubia Labov, uma das melhores interpretes do estado. Ela se dedicou muito ao texto e à tradução e interpretação do mesmo”, contou Valdete. 
Visitas guiadas ao cenário para pessoas cegas ou com baixa visão também integram as propostas de acessibilidade do espetáculo. “Em 2018, quando assisti ‘Seu Bonfim’, fiquei surpresa positivamente com a existência de interpretação em libras do espetáculo, feita por vídeo. Foi a primeira vez que vi esse tipo de acessibilidade no teatro. O edital do SESC exigia a inclusão, então essa foi uma das alternativas que escolhemos. E a questão das visitas guiadas foi uma dica que pegamos com o Território Sirius de Teatro, que também tinha essa opção para Seu Bonfim. Uma coisa que o Sidney [amigo que apresentou questões de acessibilidade e inclusão para Débora em um grupo do Facebook, em 2016] sempre diz, é que a acessibilidade deve vir antes da necessidade, então sempre que possível levo para os projetos que participo essa mentalidade. Vemos poucas pessoas ou nenhuma com deficiências físicas no teatro porque não é acessível a elas. E a acessibilidade é uma forma de fidelizarmos um público que é carente de acesso às artes”, relata Débora.

           As vozes que narram o percurso
     Do que é feito um espetáculo? Uns dirão que é feito de maquiagem (que vai transformar jovens em senhoras com mais de 40 anos), de luz (que vai reproduzir aquele sol quente do Norte na moleira de quem trabalha longe da sombra), de sons (que vai te levar para dentro da mata, para perto do rio), de vestimentas (limpas, estampadas, com cores fortes ou mais suaves), de objetos cênicos (construídos ou emprestados que levarão nossas imaginações para três, quatro ou cinco décadas atrás). Outros vão citar ainda os discursos recolhidos de fontes múltiplas e que são costurados e colocados ao sol da criatividade para germinar. E por fim vão destacar que um espetáculo é composto de gente, principalmente de gente (que vai se desdobrar para escrever, dirigir, atuar, divulgar, e muitas outras funções, não é mesmo Valdete, Tainá e Débora?). E gente mulher, que fique bem claro. “São mulheres em cena, falando sobre mulheres e o espetáculo foi escrito e dirigido por uma mulher, então é muito forte. É um espetáculo totalmente feminino. Em Vilhena, praticamente são só mulheres que fazem teatro. É muito difícil encontrar um homem para fazer um personagem. Os homens entram e saem do grupo, não se firmam, não ficam”, reflete Valdete. 
Esse protagonismo feminino veio de uma forma quase natural, segundo Tainá. “No fim das contas, apenas nós mulheres ficamos para assumir os espetáculos. É importante lembrar que além dos palcos somos responsáveis pela parte técnica, montagem dos cenários, por vezes a iluminação e transporte de tudo, isso reforça a independência e força do grupo, principalmente para outras mulheres”, destaca.
Foto Dennis Weber.

Débora explica que busca incentivar e divulgar a produção cultural e artística de mulheres. “Pois se não formos nós a levantarmos uma às outras, quem será? Então me sinto muito grata de trabalhar com mulheres tão maravilhosas e ativas no fazer artístico. Eu acho muito simbólico e potente sermos só mulheres em cena, pois a própria raiz da dramaturgia são as histórias reais de nossas mães, avós e vizinhas que vieram para Rondônia atrás de um futuro melhor. E chegando aqui, tiveram que enfrentar situações desagradáveis em uma sociedade muito mais machista do que hoje. E apesar do distanciamento temporal, mesmo um curto período de tempo, Rondônia é um estado muito novo e o espetáculo gera fácil identificação e reconhecimento no público que assiste. Por isso acho importante que esta encenação esteja acontecendo hoje, pois retrata um período não muito distante, mas que ainda representa a cultura local. É fato que vivemos em uma sociedade patriarcal, machista e capitalista e por estarmos inseridos nessa sociedade, muitas vezes não enxergamos as problemáticas que essa estrutura gera, pois parece tudo normal e natural. Mas apresentando ao público esse recorte no formato de teatro, acredito que conseguimos dar algumas cutucadas e fazer algumas pessoas pensarem e se questionarem sobre o assunto”, complementa a artista.

             1, 2 , 5... 10... 15 anos de aventuras...
O figurino de lavadeira já está no corpo da atriz, enquanto ela, com maquiagem, vai se transformando em uma mulher mais velha. O clima no camarim é de descontração, muitas risadas. Tainá faz aquecimento vocal enquanto define os contornos de sua personagem. Débora, a sonoplasta e social media do Wankabuki, confere as redes sociais do grupo.  A tradutora e interprete de LIBRAS, Nubia Labov, dá mais uma olhada no texto. O celular grava Valdete, e o interlocutor pergunta: “Val, como você se sente fazendo esse espetáculo agora...” ao que a atriz já dispara: “Com as pernas tremendo, né, porque a gente vai estrear no Palco Giratório!”. É dia 16 de setembro de 2018. Estamos a poucos minutos da noite de estreia de “À Margem”, no principal evento de artes cênicas de Rondônia, promovido pelo SESC: o Palco Giratório.  Mas o trabalho no Teatro Sesc Esplanada I começou bem antes, com a montagem da piscina no meio do palco, que representa o rio não-rio, com a afinação da luz realizada por Edmar Leite e um último ensaio para garantir que tudo funcionará conforme o planejado.
Foto Rafael Reis.

Aos poucos, o público vai ocupando as cadeiras de local, até que ... começa o espetáculo. Tainá entra em cena com uma mala grande de onde tira o caminhãozinho de madeira confeccionado pelo senhor Vilson. Adiciona na carroceria alguns bonecos de pano, que representam aqueles que migraram para a região Norte nas décadas anteriores. Em seguida empurra o brinquedo pelo palco simulando o trajeto cheio de obstáculos (o corpo da atriz se transforma em morro) até a chegada na terra de oportunidades. Seguem-se cenas com cantos de trabalho, conversa entre as lavadeiras, manipulação de bonecos que remetem à infância de Valdete e seus irmãos, entrada e saída de um cacaieiro/garimpeiro e o final marcado pelo desparecimento das lavadeiras que, agora atrizes, se banham nas águas de um rio barrento ao som do Hino de Rondônia: “Aqui, toda vida se engalana, de beleza tropical, nossos lagos, nossos rios, nossas matas, tudo enfim”. A luz vai sumindo... e fim. 
            As atrizes se secam (depois de ficarem quase uma hora dentro da piscina com água), enquanto conversam com parte do público que ficou após o espetáculo para o bate papo. “Por ser a estreia oficial, após alguns ensaios abertos apenas, fiquei um pouco nervosa, mas me senti preparada e confortável”, confidenciou Tainá meses após a primeira apresentação. De lá para cá foram mais 12 apresentações de “À Margem”, a última delas, mais uma vez, em Porto Velho, durante o Madeira Festival de Teatro, realizado entre os dias 05 e 09 de junho de 2019.  O espetáculo percorreu, em outubro de 2018, escolas estaduais e outras organizações, tocando em temas como protagonismo feminino e preservação ambiental, assuntos recorrentes na trajetória de mais de quinze anos no grupo. “Montamos de tudo, mas temos uma pegada ecológica. Em um dos textos montados falamos do desaparecimento dos índios e natureza [Espetáculo “A lenda da ecologia”, apresentado em 2005, logo no início do Wankabuki]. Em outro, o Perdidos na Floresta, de 2010, conversamos com crianças sobre a preservação do meio ambiente. Mas também trabalhamos com espetáculos que vão tratar sobre o feminino e espetáculos políticos, onde discutimos sutilmente sobre o que está acontecendo no país, na nossa cidade. Temos performances de 2014, durante a Copa do Mundo, que vão discutir várias questões políticas que o país estava passando e enquanto estava todo mundo assistindo futebol e comemorando. Nós temos uma pegada crítica em relação a vários assuntos. Se não for para criticar e falar das coisas erradas, para que trabalhar com arte, né?”, alfineta Valdete.
De 2003 até os dias atuais foram muitos os trabalhos desenvolvidos pelo Grupo de Teatro Wankabuki, que surgiu dentro da Universidade Federal de Rondônia, Campus de Vilhena. A ideia de se reunir para montar um espetáculo foi de Valdete Sousa, que havia acabado de chegar de Ji-Paraná, onde morava e participava do Grupo Arterial. A jovem migrou para o Cone Sul com o objetivo de estudar Licenciatura em Letras na Unir. “Eu precisava continuar a fazer teatro, porque pra mim teatro é uma necessidade. Comecei a ir em tudo o que diziam que era grupo de teatro, fui em teatro de escola, fui em outro que era de igreja. Queria entrar em algum grupo, não queria montar um, só que não me identifiquei com nenhum deles. Achei os trabalhos um pior que o outro.  Pensei: ‘vou na Unir mesmo, ver o que acontece’. E lá encontrei duas pessoas que se interessavam, a Núbia Rodrigues e a Diomar Soares. Começamos a conversar e elas falaram: ‘Ah que legal, também queria fazer teatro, mas nunca soube como é’.  Mostrei o texto ‘Morte e Vida Severina’ para elas,  tinha trazido todas as coisas do espetáculo que já havia sido montado pelo Arterial . O Firminetto Mendes [artista de Ji-Paraná que comandava o Grupo Arterial] me deu figurino, painel, o que tinha do espetáculo ele me deu.  Aí falei para as meninas: ‘Olha, a gente podia montar” e elas já se apaixonaram, porque João Cabral não tem como não se apaixonar, e daí começamos a trabalhar esse texto. Éramos só em três, fomos agregando gente, convidando”, relembra a presidente do grupo.
            O trio recebeu apoio de um dos professores do Departamento de Letras, Oswaldo Gomes, que estava em processo de montagem de um grupo na UNIR. Em 2004, o grupo estreou “Morte e Vida Severina”, durante o IX Seminário de Estudos Linguísticos e Literários (SELL), evento organizado pela instituição educacional. “As montagens eram bem simples, até porque eu não tinha o conhecimento que tenho hoje, que não é tanto, mas que é mais do que era naquela época [ri]. Uma coisa que eu sinto falta que fazíamos no início e que não fazemos mais é trabalhar muito com literatura. Hoje não trabalhamos mais tanto assim. Entramos em outra fase, que é a da pesquisa”, segreda Valdete.
            A esta altura da reportagem, você deve estar se perguntando qual o significado ou origem do nome estranho do grupo, né? A resposta foi dada em um livro-reportagem escrito pela atriz Núbia Rodrigues, para conclusão do Curso de Comunicação Social/Jornalismo na Unir de Vilhena. “Numa tarde enquanto subíamos a pé a rua que nos levava até a Unir, [...] Valdete, Diomar, Poliana e eu conversávamos sobre um tipo específico de teatro japonês, surgido por volta do século XVII,  [...] o Kabuki era o assunto do momento, em meio dele a constante busca por um nome para o grupo. Uma de nós que estava um pouco mais distante e distraída disse ‘ãh... kabuki?’ outra ouviu e repetiu ‘uãn kabuki’ e todas gostaram do novo som que ouviram. ‘Esse dá um nome bacana’, ‘diferente’, ‘original’, e logo estava definido e surgia, então, o Grupo de Teatro Wankabuki”, relata no livro ainda não publicado, a também licenciada em Letras e umas das fundadoras do grupo.
De Mostras de Performances (2012 a 2014), aos Festivais de Monólogos e Breves Cenas (2015, 2016 e 2018), passando por produção de videoclipe (Negrolô, 2006), leituras dramatizadas (promovidas principalmente pelo Sesc entre os anos de 2012 e 2014), saraus (Poesia da Boca para fora – 2011 e 2012), temporadas de espetáculos (Morte e Vida Severina, A lenda da Ecologia, Vai Carlos, ser gauche na vida, Tragédia no Lar, Perdidos na Floresta, José & Cia, Jujubinha e Paçoquinha em Gostosuras e Travessuras, O Amor de Colombina, Já passa das oito, À Margem) apresentações em praças vilhenenses (Projeto Invadindo a Praça, 2011) e oficinas de iniciação teatral (a partir de 2010), o Wanka, como é conhecido por seus participantes, ex-integrantes e pessoas mais próximas, experimentou várias possibilidades cênicas, passando do palco do anfiteatro da Unir para as ruas, praças, jardins, bares, casa de chá, hospitais, escolas, e outros espaços, figurando nos jornais e sites do Estado do Rondônia. “Um momento que foi muito marcante e que me emocionou bastante foi o primeiro festival que realizamos em 2015. O projeto do festival estava na gaveta já tinha uns dois anos ou mais. Era uma coisa que eu sonhava em fazer, mas não tinha ideia de que ia dar certo. Em 2015 ganhamos o edital do Banco da Amazônia e fizemos o Festival. Foi muito importante, porque mostrou que tínhamos conseguido chegar a algum lugar, trazendo para Vilhena uma série de artistas do nosso estado, para apresentações e outras atividades. O grupo para mim é um filho. Investi uma parcela grande da minha vida nisso, e é por isso que eu cuido, que eu tenho tanto cuidado, porque não é só um grupinho de amigos de fim de semana. Eu vivo isso 24 horas por dia. Minha ligação é muito forte”, revela Valdete ressaltando que o teatro, para ela “[...] é vida, é como se ele fosse um personagem vivo e ele está o tempo todo na minha vida, é uma parte dela. Não tem como ignorar! Se tirar o teatro da minha vida, eu não sei o que sobra”.

            ...  que continuamos a escrever! 
Núbia, que atualmente mora em Comodoro (MT), resgatou em seu livro-reportagem de quase cem páginas, grande parte da história do Wankabuki, desde as primeiras conversas para a montagem de “Morte e Vida Severina”, em 2003, até o momento em que o grupo se torna Ponto de Cultura, em 2017. “À Margem” ainda era uma breve cena (Contos do não-rio), apresentada durante a segunda edição do Festival de Monólogos e Breves Cenas, em 2016, mas já figura na obra. “Resgatando a imagem de um rio que durante muito tempo serviu para que as mães de família lavassem roupa, ou mesmo levassem água para casa, para beber. O espetáculo busca retratar também nuances da natureza desta região amazônica e suas peculiaridades culturais, desenvolvidas através da mistura de povos e cultura”, informa no livro.
Foto Rafael Reis.

De 2017 até agora [junho de 2019], outros momentos importantes da história do grupo continuaram a ser contados em seu blog e outras redes sociais. Um dos mais significativos foi a conquista do Prêmio Sesc de Incentivo às Artes Cênicas em 2018, que propiciou a montagem do espetáculo “À Margem”, obra mais recente do Wankabuki. Em pouco mais de um ano, muitos foram os quilômetros percorridos por Valdete, Tainá e Débora, entre Vilhena e Porto Velho, depois entre Vilhena e Cuiabá e de lá para a capital rondoniense [Débora mora atualmente na capital matogrossense, onde estuda o curso de tecnologia em teatro, com ênfase em sonoplastia], nos mesmos caminhos pelos quais passaram milhares de migrantes. Tudo isso com o objetivo de levar a públicos variados as histórias de lavadeiras, de um não-rio, de gentes à margem. Enquanto isso, relatos sobre apresentações, oficinas, enfim, das ações do Wanka, são postados quase que diariamente no Facebook, Instagram, apresentados em podcasts, entrevistas para emissoras de televisão, livros-reportagens e trabalhos acadêmicos, como este que agora você está terminando de ler. “Fico feliz porque dentro do grupo nós temos outros pesquisadores [Valdete pesquisou sobre a história do teatro em Rondônia para conclusão da Licenciatura em Letras/Português] como, por exemplo, a Núbia, que também fez a monografia dela em cima da história do grupo. Acho que a gente tem mesmo que falar sobre a nossa história, pesquisar mais sobre ela. Nós sempre tivemos essa ligação muito forte com a universidade, nós surgimos lá, então sermos convidados para congressos, ter citação sobre o grupo em um trabalho de pós-graduação de uma acadêmica da Universidade Federal do Amazonas falando sobre o nosso Festival [Amazônico de Monólogos e Breves Cenas], me deixa feliz, porque nós estamos servindo de material de pesquisa para outras universidades, outros pesquisadores e estudantes. Isso quer dizer que de alguma forma estamos começando a crescer”, pontua Valdete, enquanto planeja as próximas ações do Wankabuki.

REFERÊNCIAS
OLIVEIRA, Núbia Rodrigues de. Wankabuki: o palco é a vida! Trajetória de um Grupo de Teatro. 2017. 96 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) – Fundação Universidade Federal de Rondônia, Vilhena,  2017.  




[1] Graduado em Comunicação Social pela UNIR; acadêmico do Curso Licenciatura em Teatro da UNIR.