O Movimento PaCultura, da cidade de Porto Velho, que reúne artistas de diversas linguagens culturais vem se reunindo de forma remota com alguns candidatos e entregando uma carta elaborada pelo coletivo. As reinvindicações são poucas, mas se postas em prática poderá fazer com a cultura portovelhense dê um salto em termos quantitativos e qualitativos.
Até o momento a carta foi entregue à três candidatos, Ramon Cujui, Edvaldo Soares e Vinicius Miguel respectivamente, sendo que os dois primeiros assumiram o compromisso com os pontos reivindicados e o terceiro ficou de analisar o documento com calma.
A íntegra do documento pode ser lido abaixo.
AOS
CANDIDATOS À PREFEITURA DE PORTO VELHO
Cultura
para além dos negócios: diretrizes gerais para programas de cultura na cidade de
Porto Velho/RO
Embora
a cultura jamais tenha ocupado um espaço central no debate político, não se
pode ignorar que ela é cada vez mais dividida em dois grandes grupos: uma
pautada em um processo civilizacional e outra na dominação e nos negócios. Pelo
menos desde os anos 1940, quando surgiram os primeiros estudos sobre a
indústria cultural, a investigação nesta área revela a imbricação profunda
entre a produção de bens simbólicos e o funcionamento da sociedade de mercado,
da alienação e do consumo de massa. No Brasil atual, marcado por múltiplas
dependências típicas de um país periférico, o colonialismo cultural é o
resultado da nossa formação social, caracterizada pela escravidão, pela
brutalidade e vulgaridade das elites, pela desigualdade social e pelo
oligopólio na mídia. Chocam-se, então, duas concepções de arte e cultura.
Uma
que reconhece seu valor civilizacional e sua capacidade de emancipação humana.
Nesta perspectiva, a cultura é vista como um direito, da mesma forma que a
saúde, a educação e a moradia. É um direito porque constrói a identidade de um
povo, aguça nossos sentidos, aprimora nossa compreensão do mundo e de nós
mesmos. Arte e cultura são práticas sociais que permitem a representação e a
fabricação do mundo. Por isso, em todos os tempos há quem tente domesticá-las,
transformando bens simbólicos em produtos que se compram e vendem. Nós
propomos, ao contrário, a alegria criativa do povo, que resiste, propõe e
transforma. Esta concepção de cultura que propomos é necessariamente
incompatível com o mercado e seus velhos ou novos modelos de negócios. Ela diz
respeito à criação e fruição de bens comuns a que todos têm ou deveriam ter
direito.
Em
contraposição existe outra concepção de cultura, gestada, parida e sustentada
pelo mercado, puxada pela indústria cultural. Sabemos que é difícil nos opormos
eficazmente a este modelo, já que estamos mergulhados nele. Somente um projeto
inédito, criativo e radical pode resistir ao canto das sereias das novíssimas
economias criativas e sua ideologia do empreendedorismo, do soft power e da monetização cultural. Em
uma sociedade desigual, a produção e o acesso à arte e à cultura são também
desiguais. Por isso, uma política pública cultural preocupada com a maioria da
população deve inverter as atuais prioridades. Agora é a vez da periferia. O
Brasil é periferia e nós estamos situados, portanto, na periferia da periferia.
Uma nova política cultural precisa ser mais democrática e integradora dos
grupos minoritários, como os indígenas, caboclos, ribeirinhos, negros, mulheres,
LGBTQI+, enfim, mais descentralizada e verdadeiramente democrática. Nossa
cidade é plural e nossa cultura também deve ser.
Nossa
cidade, com mais de meio milhão de habitantes e distritos ribeirinhos muito
distantes do centro urbano tem um
grande desafio neste início de uma nova década para o futuro do setor cultural.
Além dos desafios postos em 2020 pela pandemia do novo Corona Vírus, temos
também um triste histórico recente de desmontes e ataques à cultura em âmbito
nacional e no Estado ainda está se constituindo uma política cultural.
Com o
advento da aprovação da PEC e da Lei do Plano Nacional de Cultura no ano de
2005, um movimento muito importante começou a acontecer em centenas de
municípios do Brasil. A construção do Sistema Nacional de Cultura! Cidades dos
mais diversos tamanhos e vocações culturais começaram a implantação dos seus
Sistemas Municipais de Cultura. Foi a continuidade da implantação dos Sistemas
Municipais que permitiram que o SNC sobrevivesse aos desmontes e rupturas políticas.
Todavia, com a crise pandêmica do Corona Vírus, o SNC ganhou um novo fôlego
para seu avanço, graças à aprovação da Lei Aldir Blanc, que pela primeira vez
na história utilizará o mecanismo de repasse fundo a fundo, o mecanismo central
do SNC, para distribuir recursos para todos os municípios do Brasil. A
participação social também ganhou fôlego. Os trabalhadores da cultura estão
mais uma vez mobilizados e organizados para construir as políticas culturais
pela base!
O
Movimento PaCultura, que está organizado na cidade de Porto Velho com artistas
das diversas linguagens, vem militando por uma cultura plural, democrática e
construída de baixo para cima, vem, por meio deste documento, apresentar nossas
propostas:
O
que buscamos
1) Orçamento compatível com a
importância social da Cultura;
2) Editais, leis, programas e
fundo (que já existe) desburocratizado, com dotação orçamentária própria e
comissões julgadoras plurais e democráticas, garantindo uma cultura plural e
inclusiva para o conjunto da população;
3) Transparência e
participação efetiva da população na gestão das políticas culturais através de
conferências e outros mecanismos de formulação e decisão, promovendo a
integração e a transversalidade da arte e da cultura em todos os setores da
vida social, como a educação, o esporte, o meio ambiente, a comunicação e o
trabalho;
4) A efetiva implantação do
Sistema Municipal de Cultura e o respeito ao Conselho Municipal de Cultura.
Porto
Velho, outubro de 2020
Movimento
PaCultura